A pega

Provavelmente, um dos mitos mais prejudiciais da amamentação é o de que a dor aguda e o aparecimento de fissuras/gretas nos mamilos, nas primeiras semanas de amamentação, é normal e faz parte do processo de “habituação” – até conhecido por “ganhar calo”.

A forma como o bebé pega e se posiciona na mamada é muito importante para prevenir o aparecimento de fissuras e dor, em qualquer altura da amamentação, bem como para aliviar e facilitar a cicatrização depois destas aparecerem. Também é fundamental para que consiga retirar leite com facilidade da mama, mostrando-se satisfeito após mamar e receba todo o leite necessário ao seu crescimento.

Um posicionamento desconfortável e/ou pega pouco eficaz é a causa mais comum para a amamentação dolorosa nas primeiras semanas de vida e, por isso, a causa mais comum para o abandono precoce da amamentação – mesmo numa mãe muito motivada para amamentar.

O conceito de “boa pega” ou “má pega” está, portanto, ultrapassado. O que interessa é saber se a mamada é confortável para a mãe e eficiente para o bebé – ou seja, sem dor e suficiente para o bebé se alimentar sem grande esforço.

O que é a pega (eficaz) e como promovê-la?

É o momento em que o bebé, orientando para o mamilo, abre muito bem a boca, estende a língua por cima do lábio inferior e agarra/pega na mama, envolvendo-a com a língua, para começar, de seguida, movimentos de sucção. Quando assim acontece, a mãe sente que a mamada do bebé é confortável e o bebé consegue retirar leite com facilidade.

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CksCPi5W0AAa_u8Quando um recém-nascido com fome se encontra sobre a mãe (imagem 1), inicia movimentos que lhe permitem chegar perto da mama com o pescoço em extensão e o queixo a liderar a busca (2) (3) (4). Assim que o queixo tocar a mama (5), o bebé começa a procurar pelo mamilo. Quando o mamilo tocar o filtrum (zona entre o lábio superior e o nariz) (6), o bebé abre muito bem a boca e abocanha a mama (7) (8), começando a sucção (9).

Esta sequência é conhecida por “self-attachment” (a tradução seria “auto-agarre”).

Este comportamento é instintivo e faz parte das capacidades e reflexos inatos com que um bebé saudável, de termo, nasce. Pode manter-se durante semanas após o nascimento, mesmo num bebé que nunca teve contacto com a mama.

O mais importante para desencadear este comportamento no bebé, que facilita uma pega eficaz, é o posicionamento do bebé. Importa mais a posição do corpo do bebé – bem junto ao corpo da mãe e totalmente virado e apoiado pelo dela – do que a postura da mãe.

Um bebé sem contacto com o peito da mãe tem menor probabilidade de iniciar movimentos de busca da mama. E se a cara e queixo perdem contacto com a mama durante este processo, o recém-nascido reage como se tivesse sido separado da mãe – com ansiedade e stress. Algumas mães pensarão que o bebé rejeita mamar, na sequência de um episódio deste género. Acalmar o bebé, facilitar o contacto da mama com a face, voltar a colocar o bebé numa posição neutra, ajudam-no a reorganizar o comportamento e a acalmar-se para voltar a iniciar a mamada.

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Para além do posicionamento, que outras questões podem dificultar a sucção do bebé?
  • Interferência de tetinas (chupetas, biberão, mamilos de silicone);
  • Intervenções no parto (medicação, distócia, intervenções sobre o bebé no pós-parto imediato como aspiração das vias aéreas, etc.);
  • Questões anatómicas do bebé ou da mãe (freio da língua/lábio curto, mamilos/mamas diferentes, etc.);
  • Problemas de saúde do bebé.

Não é raro encontrar uma mãe com dor e feridas a quem lhe disseram que o bebé faz “uma boa pega”, deixando aquela mãe e aquele bebé sem apoio adequados e explicação e solução para a dificuldade sentida. A forma como o bebé coloca os lábios, o queixo, etc. não importa nada se a mãe agoniza com dor ou o bebé não recebe leite suficiente.

Procure ajuda se sente que alguma coisa não está bem consigo e o bebé! Procure ajudar se é um profissional, encaminhando para outro se não souber como fazê-lo!

Em jeito de resumo, lembre-se que:

  1. Bebé e mãe têm comportamentos neurológicos instintivos e inatos que lhe permitem iniciar e manter a amamentação – um ambiente acolhedor, tranquilo e o suporte da família e profissionais é importante para promove-los;
  2. A sucção do bebé não tem de provocar dor, causar feridas nos mamilos, nem os mamilos têm de se “habituar” à sucção do bebé;
  3. Um posicionamento favorável (com o bebé junto ao corpo da mãe e apoiado no corpo dela) resolve grande parte das dificuldades na amamentação;
  4. Pode pedir ajuda de uma conselheira de amamentação assim que surja alguma dificuldade.

Fonte bibliográfica: Supporting Sucking Skills in Breastfeeding Infants, Catherine Watson Genna

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